Um fotógrafo-artista me disse outra vez: veja que pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais importante do que o sol inteiro no corpo do mar.
Falou mais: que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem com barômetros etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.
Assim um passarinho nas mãos de uma criança é mais importante para ela do que a Cordilheira dos Andes. Que um osso é mais importante para o cachorro do que uma pedra de diamante.
E um dente de macaco da era terciária é mais importante para os arqueólogos do que a Torre Eifel. (Veja que só um dente de macaco!) Que uma boneca de trapos que abre e fecha os olhinhos azuis nas mãos de uma criança é mais importante para ela do que o Empire State Building.
Que o cu de uma formiga é mais importante para o poeta do que uma Usina Nuclear. Sem precisar medir o ânus da formiga. Que o canto das águas e das rãs nas pedras é mais importante para os músicos do que os ruídos dos motores da Fórmula 1.
Há um desagero em mim de aceitar essas medidas. Porém não sei se isso é um defeito do olho ou da razão. Se é defeito da alma ou do corpo. Se fizerem algum exame mental em mim por tais julgamentos, vão encontrar que eu gosto mais de conversar sobre restos de comida com as moscas do que com homens doutos.
Fonte: Manoel de Barros in Memórias Inventadas
Adorei a diversidade de cores das fotos,perfeitas. Sua sensibilidade continua em alta. Bjs.
ResponderExcluirIria passar por esse barco 100 vezes e nem iria me dar conta dessa sensação de solidão que a foto me inspira.
ResponderExcluirDaí a riqueza da palavra de Manoel de Barros...nos livrarmos de coisas que já tem um sentido pronto. Prá fotografar assim imagino que seja preciso deixar as coisas simplesmente ser...sem emoldurar. É assim q vc faz...